Biotecnologia

Os cérebros dos morcegos preveem os seus próximos movimentos durante o voo

Uma nova investigação sugere que os morcegos mantêm consciência das suas posições passadas, presentes e futuras para encontrarem o seu caminho.

Mais de mil espécies usam a ecolocalização, mas após milhões de anos de evolução, os cérebros dos morcegos estão especificamente otimizados para a navegação.

Um novo artigo publicado no início de julho na revista científica Science sugere que, conforme os morcegos voam, neurónios especiais conhecidos como células locais, localizados nos seus hipocampos, uma parte do cérebro que controla a memória, os ajudam a processar informações de navegação importantes sobre a sua posição não apenas no momento, mas também no passado e no futuro.

“A descoberta é meio intuitiva, porque nós, pelo menos como seres humanos, temos a capacidade de pensar sobre onde estamos ou onde estivemos”, diz Nicholas Dotson, cientista de projetos do Instituto Salk e o principal autor do estudo.

Usando uma combinação de um aparelho de registo de dados neurais sem fio e um sistema de registo de movimento composto por 16 câmaras, Dotson e o seu coautor Michael Yartsev, professor de neurobiologia e engenharia da Universidade da Califórnia em Berkeley, observaram seis morcegos-da-fruta egípcios em duas experiências destinadas a registar descargas de atividade neural.

Enquanto alguns dos morcegos exploravam aleatoriamente uma sala coberta com espuma preta para minimizar as reverberações acústicas, outros receberam uma tarefa de forrageamento que envolvia comedouros internos, e um dos animais foi até testado em ambos os ambientes.

Através de alguns marcadores presos às cabeças dos morcegos e de um microdrive implantado nos seus cérebros, a equipa foi capaz de ver mudanças temporais mínimas na atividade neural e registar a forma como os morcegos estavam a interagir com novos fragmentos de informação espacial.

Descobriram que, tanto na exploração aleatória quanto durante a navegação orientada para um objetivo, como na tarefa de forrageamento, os morcegos mantinham uma memória espacial detalhada do ambiente e dos caminhos que percorriam. Para além disso, os testes revelaram que os morcegos têm perceção espacial das suas posições futuras.

“Temos neurónios que são disparados simultaneamente, mas que representam partes diferentes de um caminho maior”, diz Dotson. “Assim, representam o passado, o presente e o futuro, não apenas o agora”.

Ser capaz de mapear a sua posição ao longo do tempo com este sistema de GPS natural é uma das maiores ferramentas de sobrevivência dos morcegos, ajudando-os a localizar comida e a fugir de predadores.

Diferentes espécies podem ponderar a relevância de experiências passadas, presentes e futuras de maneiras diferentes, observa o estudo. Num cenário de sobrevivência como “macacos a saltar entre galhos de árvores ou humanos a conduzir um carro ou a esquiar ladeira abaixo a alta velocidade”, por exemplo, as informações futuras podem ser mais importantes para a sobrevivência.

“O morcego deve planear localmente no tempo e no futuro para ter sucesso nos seus comportamentos de caça”, diz Melville Wohlgemuth, investigador do Batlab da Universidade do Arizona. “Estes são processos cerebrais que também são relevantes para as nossas vidas”.

A análise de espécies diferentes da nossa sempre foi uma marca registada da neurociência, e estudar o hipocampo dos morcegos poderia dar aos cientistas mais dados sobre como certas doenças afetam o nosso cérebro.

Por exemplo, aprender mais sobre os morcegos pode mudar a forma como vemos a doença de Alzheimer, um distúrbio cerebral que destrói lentamente as funções cognitivas e a memória. Os doentes de Alzheimer têm dificuldade em andar intuitivamente por novos caminhos ou locais, mesmo quando já se depararam com eles algumas vezes.

Artigo de Tatyana Woodall, Team – MIT Technology Review EUA

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